Apesar da costa marítima brasileira ser dotada de dimensões continentais, com cerca de 8 mil quilômetros de extensão, toda ela navegável, o transporte de mercadorias por este modal nunca foi considerado prioritário no país. A recente greve dos caminhoneiros expôs a vulnerabilidade do transporte rodoviário quando provocou o desabastecimento de víveres nas cidades ou de matérias primas nas unidades produtivas. A solução de curto prazo adotado pelas grandes empresas, de adquirirem frota própria de caminhões, foi acompanhada do aumento da navegação de cabotagem, como forma de escapar do problema.
O transporte por via marítima, de um ponto a outro da costa brasileira, merece ser melhor estudado para que suas vantagens sejam identificadas e aumentadas e as desvantagens mostradas e reduzidas. As vantagens estão relacionadas à capacidade de carga, baixo consumo de energia, baixa agressividade ao meio ambiente, segurança e benefícios sociais. As desvantagens são os preços dos combustíveis, vagarosidade, limitação das rotas e restrição ao capital estrangeiro.
Comentando as vantagens, aludo o uso dos contêineres, os chamados cofres de carga, que revolucionou o transporte marítimo no quesito alta capacidade de movimentação e integração com o transporte rodoviário. Os navios são capazes de transportar maior volume do que os caminhões e o carregamento e descarregamento são mais rápidos se as mercadorias são acondicionadas em contêineres. Com os contêineres o transporte continua sendo porta a porta; os combustíveis dos navios, chamados de bunker, entre eles o diesel naval, tem elevada eficiência energética, sendo reduzido o consumo por movimentação de unidade de carga. Os cuidados com a diminuição do teor de enxofre na fabricação do bunker contribuem com a redução do potencial de agressão ao meio ambiente, colaborando com a conservação da natureza, diminuindo a poluição e os riscos de acidentes; em relação à segurança das cargas, o transporte marítimo expõe menos as mercadorias reduzindo os riscos de assaltos e roubos de cargas; finalmente, maior uso da cabotagem reduz o número de caminhões nas estradas, atenuando os engarrafamentos, diminuindo os custos de manutenção das rodovias, restringindo o número de acidentes, otimizando, assim, os benefícios sociais.
Anotando as desvantagens, cito o preço dos combustíveis dos navios, por não gozarem das isenções fiscais dos de longo curso nem dos subsídios do diesel dos caminhões; a vagarosidade dos navios e a entrega porta a porta dos caminhões representa desvantagem para o transporte por cabotagem, sendo crucial quando os prazos de entrega são pequenos; a limitação das rotas é decorrente da falta de investimentos no setor portuário, tornando deficiente, também, a integração com outros modais de transporte; por fim, a exigência de que a atividade seja realizada por embarcações com bandeira nacional é uma barreira ao ingresso de capital estrangeiro nesse tipo de navegação.
Uma das providências que se poderia tomar para incentivar a navegação de cabotagem, seria a da isenção do ICMS, como acontece com a navegação de longo curso, caso em que o bunker é considerado produto de exportação e isento de impostos. O governo federal isentou o bunker dos impostos federais (PIS, Cofins) na cabotagem, mas os governos estaduais insistem em manter a cobrança daquele tributo. O problema fica mais grave quando se considera que o custo do combustível de um navio pode representar até 60% de seu custo operacional, sendo item importante na sua planilha de resultado. No Estado da Bahia a alíquota de ICMS é fixada em 28%, imposto cobrado por dentro, equivalente a 38,9% se o cálculo fosse feito por fora, para usar uma linguagem dos auditores fiscais. A isenção do ICMS do bunker poderia ser obtida através de uma resolução do Conselho Nacional de Política Fazendária – Confaz, órgão que congrega as secretarias estaduais da fazenda.
Fica aqui uma sugestão importantíssima para redução do frete e da vulnerabilidade existente no setor de transporte de cargas, revelada com maior clareza pela greve dos caminhoneiros.