Bastou a epidemia ser confirmada para as correntes de internet anunciarem: “Consumir Vitamina C e alho evita a contaminação pelo coronavírus”. Considerada fake news pelo Ministério da Saúde, em nota divulgada no site do órgão, a informação levanta a questão: um sistema imunológico forte é suficiente para livrar o individuo do coronavírus e das famosas viroses pós-Carnaval?
Na verdade, não, mas aumenta – e muito – as chances de recuperação em caso de contaminação. Como? O que esse sistema poderoso é capaz de fazer para contribuir com a batalha que assola o mundo? Como fortalecer o sistema imunológico? Quais são os fatores que desequilibram esse aliado do corpo? É isso o que especialistas consultados pelo CORREIO vão explicar nesta matéria.
Para além das recomendações de lavar as mãos com frequência, usar álcool gel e máscaras, imunologistas, infectologistas e profissionais de outras áreas indicam uma série de ações para tornar o corpo mais resistente. Afinal, não só o coronavírus está ameaçando a população, mas doenças já conhecidas como H1N1 (ou gripe suína), dengue, zika e chikungunya, só para citar algumas.
O primeiro passo indicado pelos especialistas é entender que o sistema imunológico – conhecido como o exército de defesa do corpo – é complexo e composto por vários componentes. De uma maneira simplificada, ele inclui o chamado sistema imune inato (as barreiras de proteção natural do corpo, como a própria pele e as mucosas) e tem uma cadeia de células que circulam no sangue, conhecidas como anticorpos.
“O sistema imunológico é uma maneira de ter equilíbrio entre o meio exterior e o organismo. Esse sistema está constantemente sendo desafiado. Quando ocorre a quebra desse equilíbrio, o excesso ou a falta de funcionamento pode levar a problemas”, explica o imunologista Regis Campos, 55 anos, professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e membro da Associação Brasileira de Alergia e Imunologia.
Fraquezas
Outro ponto importante, continua Campos, é que o sistema do indivíduo oscila e isso é normal. São inúmeros os fatores que fazem com que ocorra essa oscilação, como a qualidade da alimentação, do sono, a agressividade do agente infeccioso, a preexistência de outras doenças, o uso de medicamentos e a programação genética do indivíduo. Ou seja, cada caso é um caso.
Então, vamos com calma para entender melhor como lidar com esse aliado na defesa do corpo. Já se sabe que o sistema imunológico é como se fosse um exército “pronto para te defender dos agressores”, reforça a infectologista Nanci Silva, professora da Escola Bahiana de Medicina com mais de 30 anos de experiência na área.
“Em um processo viral, quem entra em ação é ele. É a sua defesa. A pele é um sistema imune? É. O fígado é um sistema imune? É. Todos os órgãos produzem células, é um maquinário fenomenal e complexo”, afirma Nanci. E quais são os fatores que enfraquecem esse exército? O cigarro é um deles, afinal “a pessoa que fuma queima as células do nariz que existem para proteção e aumenta os riscos de ter doenças”, explica a infectologista.
Além disso, uma noite mal dormida é capaz de aumentar a chance de adquirir doenças infecciosas, como pneumonias e gripes, acrescenta a otorrinolaringologista e médica do sono Cristina Salles. “Os distúrbios do sono, horas de sono comprometidas, tornam o organismo mais susceptível a doenças infecciosas devido a uma resposta imunológica inadequada ao combate da infecção”, explica.
O consumo de álcool, a má alimentação, o excesso de exercícios de alto rendimento que desgastam o corpo e o uso de alguns medicamentos também diminuem a imunidade. Os corticoides, por exemplo, quando usados por um período pequeno são capazes de diminuir o processo inflamatório, mas se usados por um período longo podem diminuir a produção da defesa do corpo, explica o imunologista Regis Campos.
A falta de saúde mental é outro fator que merece atenção. “É preciso estar forte como um todo. O indivíduo quando está deprimido, também tem deficiência. O alcoólatra, por exemplo, também deprime”, alerta a infectologista Nanci Silva. “O sistema imune é extremamente importante para a defesa. O que as pessoas devem fazer é evitar essas coisas que destroem”, indica. “Importante é tentar manter uma vida saudável”, acrescenta.
Força
Então, afinal, como fortalecer o sistema imunológico? Como era de se esperar, através de uma boa noite de sono, da prática saudável de exercícios físicos e de uma boa alimentação. A hidratação também é importante, já que é capaz de diminuir a febre e aumentar a produção de urina, um dos caminhos pelos quais os vírus e as bactérias são eliminados do corpo.
“O top da lista é a hidratação. Se a pessoa não bebe líquidos, nossas secreções ficam concentradas, então os vírus e as bactérias vão se multiplicar mais rápido. O excesso é eliminado no suor, nas fezes e na urina. Se não está hidratado, o corpo não produz urina”, explica a chefe de Nutrição do Hospital Português, Gildete Fernandes.
Quando o assunto é alimentação, é importante manter uma dieta equilibrada e rica em frutas, vegetais e proteínas. “A albumina é a base da imunidade da gente, é a proteína que permeia todos os músculos e tecidos. É produzida no fígado, a partir da alimentação. Com a albumina baixa, a gente não tem formação de célula nenhuma”, explica Gildete.
E a tão falada Vitamina C, que virou alvo de fake news? “Vitamina C não mata bactéria, nem vírus nenhum. O alimento não mata nada, mas vai te fortalecer para você reagir melhor”, afirma a nutricionista. Por isso, a solução para aumentar a imunidade é investir na qualidade de vida melhor como um todo.
E com isso o indivíduo está livre das doenças? “Com o sistema forte, a chance de se recuperar de um processo grave é infinitamente maior. Mas se trabalhar com tudo perfeito, às vezes a quantidade de microrganismos é grande”, explica Nanci. Por isso a infectologista destaca a importância da vacinação. “Trabalhamos com redução de danos. E todo mundo precisa fazer sua parte”, alerta.
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Hidratação
Diminui a concentração de secreções que eliminam bactérias e vírus (urina, fezes e suor). Beba água, chás, cafés, caldos e frutas ricas em água como abacaxi e melancia.
Alimentação
Tenha uma alimentação rica em frutas, vegetais e proteínas. Quanto mais colorido o prato, melhor: garante a Ingestão de vitaminas e minerais eliminados na transpiração.
Proteína
Base da imunidade, a albumina é a proteína que permeia todos os músculos e tecidos. É produzida no fígado, a partir da alimentação. Fonte: carnes, arroz, feijão, lentilha.
Vitamina C
Não mata bactérias e vírus, mas fortalece a imunidade. Fonte: tangerina, limão, laranja, mamão. A pastilha tem dez vezes a quantidade ideal (85 mg), sendo eliminada na urina.
Higiene
Lave as mãos da forma correta e higienize os alimentos (uma colher de sopa de 15 ml de cloro, em um litro de água). Processo importante, para evitar as infecções cruzadas.
Sono
Ter uma boa noite de sono favorece a renovação celular e diminui a chance do indivíduo de adquirir doenças infecciosas, tais como pneumonias e gripes.
Cigarro
Evite fumar, porque o cigarro queima as células do nariz que existem para proteção. Aumenta os riscos de doenças, porque abre a mucosa para a entrada de vírus etc.
Bebida
Evite bebidas alcoólicas em excesso, porque comprometem e sobrecarregam o fígado. Este é responsável por produzir e eliminar as toxinas do organismo.
Mente
Cuide da saúde mental, porque o indivíduo que está deprimido tem o sistema imunológico comprometido. quem é alcoólatra, por exemplo, pode deprimir e diminuir sua resistência.
Vacina
A vacina é o que mais diminui a incidência de doenças. Muitas vezes o agente causador é muito agressivo e o corpo com imunidade forte não é capaz de combater.
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Um dos fatores importantes para o aumento da imunidade e da renovação celular, o sono está em destaque até quinta-feira (19), em Salvador, durante a Semana do Sono 2020. Promovida pela Associação Brasileira do Sono (ABS), a campanha de conscientização social busca fazer um alerta sobre a importância do sono para a saúde física e mental.
A programação, dedicada aos profissionais da área, tem como tema Sono e Sonhos Melhores para um Mundo Melhor. “Todos os médicos do sono estão mobilizados para conscientizar a população de que 60% das pessoas têm algum distúrbio do sono”, explica a otorrinolaringologista e médica do sono Cristina Salles.
Responsável pelas paletras de hoje e de amanhã, Cristina destaca que a ideia é sensibilizar a investigação diagnóstica precoce e o tratamento, além de chamar a atenção para o fato de que o sono de pouca qualidade pode estar associado a diversos fatores. Entre eles, o comprometimento do sistema imunológico, as doenças cardiovasculares, a obesidade e a hipertensão arterial.
Além disso, a médica do sono ressalta que a privação do sono está relacionada ao comprometimento da memória, à irritabilidade, à dor de cabeça, ao comprometimento do rendimento escolar e profissional e aos acidentes automobilísticos.
Outro ponto destacado pela profissional é que a redução das horas de sono também é capaz de aumentar a chance de desenvolvimento de câncer, como o de mama. “Logo, a melhor qualidade do sono permitirá sonhar com um envelhecimento de melhor qualidade quando comparado aos indivíduos que têm sono comprometido”, defende Cristina.
Fome
Além da imunidade mais baixa, a médica destaca que estudos têm demonstrado que os indivíduos que dormem menos – seja por privação do sono, seja por redução das horas de sono – têm maior possibilidade de ganhar peso do que aqueles indivíduos que dormem cerca oito horas por noite.
“A redução das horas de sono aumenta a ação do hormônio que gera sensação de fome e diminui o hormônio que dá sensação de saciedade. Como consequência, há o aumento do apetite e da fome, a maior ingestão alimentar e maior probabilidade de desenvolver a obesidade”, justifica Cristina.
Questionada por que as pessoas estão dormindo menos, a médica do sono explica que o fenômeno está associado à exposição a luz, relacionado a estímulos como celular, televisão e luz branca, que interferem na liberação do hormônio chamado melatonina. “Quanto maior a exposição à luz, menor a liberação da melatonina, consequentemente menos horas de sono”, conta.
Programação da semana do sono
Segunda-feira (16)
8h às 12h Palestra com a médica do sono Cristina Salles.
Tema: Sono e sonhos melhores para um mundo melhor
Hospital das Clínicas – UFBA
Terça-feira (17)
8h às 12h Palestra com a médica do sono Cristina Salles
Hospital Santa Isabel
Quarta-feira (18)
8h às 12h Palestra com Dra. Andrea Barral
Quinta-feira (19)
13h às 19h – Palestra com Dr. Davi Sobral
Ação no Hospital Irmã Dulce
Dicas para uma boa noite de sono
– Ir para a cama com sono
– Manter o quarto escuro e silencioso à noite
– Manter a temperatura do quarto confortável
– Caso precise levantar durante a noite, procure usar lâmpadas adequadas evitando luz branca ou azul
– Evitar o uso de medicamentos para o sono sem prescrição médica
– Evitar fazer atividades na cama como assistir TV, usar smartphones, ler e-mails
– Evitar alimentação pesada próximo do horário de dormir
– Evitar o uso de bebida alcóolica e alimentos ou bebidas que contenham cafeína próximo do horário de dormir
– Praticar exercícios físicos regularmente evitando os mesmos perto do horário de deitar
– Evitar tabagismo
Horas de sono recomendadas por faixa etária
Recém-nascido – De 14h a 18h por dia
3-5 anos – 13h a 15h por dia
6-12 anos – 9h a 11h por dia
Adolescência – 8h a 10h
Vida adulta – 7h a 9h; média de 8h por dia
Fonte: Correio 24 horas