Foram poucos os fogos soltados pelos empresários e governos dos quatro países que compõem o Mercosul e os 28 que formam a União Europeia (UE), pelo que representa de positivo a finalização das negociações para o acordo entre os dois blocos. A UE é um mercado comum onde existe uma união aduaneira com políticas comuns de regulamentação de produtos e com liberdade de circulação de pessoas, serviços e capitais. O Mercosul tem significado mais restrito, sendo apenas uma área de livre comércio com tarifas eliminadas ou reduzidas, sem quotas e preferências dos bens comercializados. Pode ser considerada como um caminho para se alcançar uma união aduaneira. O tratado firmado inclui bens, serviços, investimentos e compras governamentais.
O Brasil, o maior país do Mercosul e que participa com apenas 1,2% do comércio mundial, será o mais beneficiado. As primeiras estimativas revelam que haverá um aumento de cerca de US$ 100 bilhões nas suas exportações e que os novos investimentos sofrerão um salto superior a US$ 110 bilhões, mergulhando num mercado de US$ 500 bilhões. Está na hora de abrirmos os olhos e aprendermos a agir estrategicamente. Não se deve, por exemplo, querer exportar tudo que produzimos, de veneno de cobra a aeronaves, como fazemos hoje, mas sermos seletivos, dando preferência aos bens e serviços onde temos vantagens comparativas e que estejam na lista dos produtos mais importados pela UE. Exportar o que eles estão comprando é mais fácil do que exportar o que fabricamos e não representa um hábito de consumo. Também não deve ser esquecido que o comércio mundial para ser forte, tem de ter duas vias, uma de ida outra de volta.
Se somos bons no agronegócio, os esforços devem ser concentrados aí. A ideia de ampliarmos as exportações de suco de laranja, café solúvel e frutas é boa, e podemos começar por este caminho. O açúcar que produzimos a partir da cana tem valor dos mais baixos do mundo. O açúcar de beterraba tem custo de produção quase quatro vezes maior e só é mantido com elevado subsídio governamental que protege os agricultores locais. A eliminação das cotas nos daria supremacia mundial nesse adoçante.
A técnica aplicada pela Agrovale, na região de Juazeiro, na Bahia, de irrigação por gotejamento subterrâneo, com baixo consumo de água, tem a marca de cerca de 300 toneladas por hectare (t/ha) de cana, superando em muito os tradicionais 50 t/ha dos produtores alagoanos e dos 90 t/ha dos paulistas de Sertãozinho, sendo a maior produtividade agrícola do mundo. A utilização das extensas terras planas das margens do Rio São Francisco, de fácil mecanização, permitiria um aumento considerável da produção de açúcar e álcool incluídos no tratado Mercosul/UE. Se somaria a isso o emprego da técnica de hidrólise enzimática na produção de etanol de segunda geração a partir do bagaço da cana-de-açúcar para aumentar o volume da oferta desse combustível renovável. Enfim, o acordo assinado abre perspectivas de aumento de investimentos, inclusive e, sobretudo, de capital estrangeiro, em novos campos da produção na fabricação de insumos energéticos competitivos, por demais, no mercado mundial.
O sucesso do acordo significa também um avanço para o Mercosul. O ingresso de outros países, a integração maior dos americanos do sul, a negociação em bloco e os avanços tecnológicos que por certo virão, são ganhos de difícil aferição nos primeiros anos de seu funcionamento. Necessário também a participação dos governos e empresários de todo o país. O modelo adotado nas negociações do Mercosul, por exemplo, predominantemente setoriais e muito pouco regionais, terminou por privilegiar as regiões mais desenvolvidas. As entidades setoriais da iniciativa privada têm sede em São Paulo e a participação exclusiva delas nas tarefas de negociação do refinamento do acordo, terminam por beneficiar o Sudeste, em detrimento das demais regiões.
Como se pode observar, não se esgotam aí as notas sobre a otimização do tratado. O novo caminho está cheio de novas esperanças, mas recheado de percalços. Nada que não se possa superar.